REAÇÕES PERSECUTÓRIAS EM POLICIAIS VÍTIMAS DE VIOLÊNCIA

Autores

  • MARCELO AUGUSTO RESENTE

Resumo

Este trabalho é fruto de uma pesquisa qualitativa realizada com policiais militares de Belo Horizonte, em 2004, com objetivo de compreender melhor os sentimentos desses profissionais vítimas de violência2, proveniente da própria instituição policial e/ou da singularidade do trabalho como agentes de segurança.
Atuando há doze anos como psicólogo do quadro de oficiais de saúde da PolíciaMilitar de Minas Gerais (PMMG), o pesquisador teve a oportunidade de trabalhar em vários setores, observando tanto aspectos importantes da dinâmica organizacional como peculiaridades da profissão de policial
militar. Inicialmente, atuou no Centro de Recrutamento e Seleção de candidatos aspirantes ao cargo de policialmilitar emvárias regiões do Estado. Posteriormente, prestou serviços na Junta Central de Saúde , realizando perícias psicopatológicas empoliciais efetivos.Nomomento, exerce suas atividades profissionais na Clínica de Psicologia e Psiquiatria do Hospital Militar, onde trabalha como psicoterapeuta, assistindo militares e respectivos dependentes. Relatos de colegas de trabalho, assim como dados recolhidos em entrevistas, perícias e sessões clínicas, levaram-no, gradualmente, a detectar indícios expressivos de reações persecutórias em integrantes desta organização, tais como desconfiança, discriminação, temor, suspeita e sensação de estar sendo perseguido, explorado, maltratado, prejudicado
ou enganado, a partir da entrada na instituição militar.
Ao ingressar no Centro de Formação, o candidato passa por um período de adaptação à cultura policial, quando são ensinados os fundamentos básicos da profissão e a maneira de conduzir-se conforme as normas estabelecidas pelo Regulamento da PM. Começa a transformação em policial. Muitos aspectos da
vida pregressa serão abandonados em prol da nova identidade. A vigilância e o controle sobre o aluno vão se acirrando e, conseqüentemente, ele sofre restrições em sua liberdade e autonomia.
Uma vez inserido na instituição, o policial fica submetido às regras da casa , passando a ter as mesmas obrigações dos colegas de farda; desse modo, qualquer descuido ou desobediência pode acarretar punição. Cabe ao subordinado, quando infringe normas, apresentar justificativa que será avaliada pelo superior, podendo este atenuar ou agravar a situação do militar, assim como encaminhá-lo ao Conselho de Ética e Disciplina Militares da Unidade (CEDMU). Em alguns casos, como constatado na pesquisa, o policial é
discriminado e perseguido no local de trabalho, seja pela chefia, seja por companheiros de serviço, o que compromete seus relacionamentos e o conduz ao isolamento.
Com o decurso do tempo, o desgaste causado pelo trabalho, bem como as experiências absorvidas na vida dentro da organização e na prática junto à comunidade, vão se somando, de tal forma a se refletirem no psiquismo do policial, manifestando-se em relatos do tipo: Estava muito bem até a chegada do novo chefe ; Estãome perseguindo ; As paredes têmouvidos ; Não se pode confiar em ninguém ; Prendi fulano e agora estou sendo ameaçado ; Sempre fiz tudo pela PMe, agora que preciso dela, ela me vira as costas ; O comandante disse que ninguémia ser transferido e no dia seguinte fui para
outro batalhão ; Fazia o melhor para a PM, mas meu chefe mandou-me parar porque não era de seu interesse ; Meu chefe fazia tudo para eu pedir baixa ; Fui ao Batalhão pedir ajuda para omeumarido e acabarampor desmerecê-lo na frente de todos, aplicando-lhe uma punição ; Na hora da promoção fui desprezado . Alguns desses relatos se fundamemvivências reais, porém outros surgememfunção do clima gerado pela própria peculiaridade da profissão e pela dinâmica organizacional.
A desconfiança, a insegurança e a incerteza provocam instabilidade emocional, ansiedade e medo, que minam as resistências do policial e o levam a não ter a mesma disposição para enfrentar os percalços do trabalho. Muitos se tornam desajustados, omissos ou violentos, passando a dispensar tratamento inadequado aos cidadãos a quem devem proteger; tendem à introspecção, ficando mais preocupados e sisudos, afastandose dos contatos interpessoais e, em conseqüência, adoecem psiquicamente, podendo até cometer atos
hetero e/ou autodestrutivos.

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Publicado

2007-01-01